sábado, 19 de setembro de 2009

VMBE

A VMBE - Maximum Brake Energy Speed - é a velocidade máxima suportada pelos conjuntos de freio, caso seja necessário interromper a decolagem. Para entender como a VMBE é definida, alguns conceitos são necessários.

Energia Cinética

Energia Cinética é a energia acumulada por um corpo em razão de estar em movimento. Quando um corpo está parado, sua energia cinética é zero. Tão logo esse corpo entre em movimento, sua energia cinética aumenta, na razão da equação



onde:

Ec - energia cinética
m - massa do corpo
v - velocidade de deslocamento do corpo

Sendo assim, durante a decolagem, a energia cinética de uma aeronave aumenta de forma proporcional ao quadrado da velocidade, chegando a valores muito grandes quando em altas velocidades. Por exemplo, uma aeronave decolando com peso de 180 toneladas e numa velocidade de 150kts, tem energia cinética igual a 1,389 x 10^7 J.

Pela Lei de Conservação de Energia, a energia em um corpo não pode ser destruida, podendo apenas mudar de forma. Sendo assim, para parar uma aeronave em movimento, a energia cinética acumulada precisa ser transformada em outro tipo de energia. Os conjuntos de freios são responsáveis por converter energia cinética em energia térmica.

Conjuntos de Freio

Os conjuntos de freio das aeronaves são compostos por vários pares de estatores, que são partes fixas, presas à estrutura dos trens de pouso e rotores, que são partes móveis e giram juntamente com as rodas. A figura 1 ilustra um conjunto de freio.


Figura 1 - Conjunto de freio

Quando os pedais de freio são pressionados, a pressão hidráulica é liberada para os pistões, que fazem os rotores e estatores entrarem em contato, gerando o atrito necessário para frear a aeronave. Essa frenagem nada mais é do que a transformação da energia cinética, acumulada na aeronave em função de sua velocidade, em calor. Um conjunto de freio é, portanto, um conversor de energia cinética em energia térmica e essa conversão segue o ilustrado na equação



onde:

c - calor específico do material do freio (constante específica)
mh - massa do conjunto de freio (rotores e estatores)
Dt - variação de temperatura do freio

Uma vez que o calor específico e a massa do conjunto de freio são constantes em uma dada decolagem, pode-se concluir que a variação (aumento) de temperatura nos conjuntos de freio aumentam proporcionalmente à energia cinética a ser transformada e, então, aumenta com o quadrado da velocidade.

Por isso, em abortagens de alta velocidade, a temperatura dos freios chega a valores muito elevados e, em casos extremos, ocorre incêndio e destruição dos conjuntos, fazendo a aeronave perder sua capacidade de frenagem. A VMBE garante que isso não ocorrerá e a aeronave irá parar de forma segura.

Uma vez que o DELTA t não pode ser maior que a diferença entre a temperatura do freio antes do início da frenagem e a temperatura máxima suportada pelo conjunto, quanto maior a temperatura ambiente, menor a quantidade de energia que o freio pode dissipar pois o DELTA t será menor.

Demonstração da VMBE

O FAR 25.735(f) requer que sejam realizados testes em dinamômetros e em voo para demosntrar:

  1. A capacidade de absorção de energia do sistema de freio seja igual ou superior a energia cinética de uma aeronave num pouso com peso máximo, considerando-se toda a faixa de desgaste dos conjuntos de freio (desde um freio novo até o máximo desgaste permitido para uso). Nesse ensaio, a desaceleração média não pode ser inferior a 10 fps2 .
  2. A capacidade de absorção de energia do sistema de freio seja igual ou superior a energia cinética de uma aeronave em uma decolagem rejeitada no peso máximo, considerando-se toda a faixa de desgaste dos conjuntos de freio. A desaceleração mínima é de fps2 .
  3. A capacidade de absorção de energia na condição de pouso mais severa, ou seja, na combinação de peso e velocidade que resulte na maior energia cinética.
Nos testes com aeronaves, deve ainda ser demosntrado que, após a parada total da aeronave e aplicação do freio de estacionamento, não deve surgir nenhuma condição de fogo nos freios, rodas ou pneus que possa prejudicar uma evacuação segura e completa da aeronave por, pelo menos, 5 minutos.

Até 1988, os testes com aeronaves podiam ser feitos com conjuntos de freios novos. Após a ocorrência de em acidente com um DC-10, onde 8 dos 10 conjuntos de freio estavam dentro do desgaste limite e não suportaram uma rejeição de decolagem, o FAR 25 passou a exigir que os testes sejam realizados com freios 90% desgastados.

Após a determinação da máxima energia cinética suportada pelos freios na decolagem, determina-se a VMBE, que deve ser analisada em todas as decolagens. A VMBE estabelece um limite máximo para a V1 e, consequentemente, para o peso máximo de decolagem, como será visto mais a frente.

Normalmente, a VMBE apresenta-se como limitante em pistas com grande elevação, altas temperaturas e utilização de pouco flap / slat para decolagem, pois essas decolagens têm velocidades altas e, por isso, muita energia cinética.

VEF

A VEF - Engine Failure Speed - é definida felo FAR 25.107 (a)(1) como a velocidade escolhida pelo fabricante da aeronave na qual assume-se a falha do motor crítico. A VEF não pode ser inferior à VMCG pois, à partir da VEF deve ser possível interromper ou prosseguir na decolagem.

A escolha da VEF influenciará a determinação da V1, como será visto mais adiante.

domingo, 13 de setembro de 2009

VMU

Na sequência de definições de velocidades, está a VMU - Minimum Unstick Speed.

De acordo com a definição do FAR 25.107(d), a VMU é a menor velocidade que permite à aeronave deixar o solo com segurança e prosseguir na decolagem. A VMU deve ser determinada em ensaios realizados pelo fabricante, na faixa de relações peso - potência que deseja-se certificar a aeronave, isto é, nas diversas combinações de peso e tração de decolagens possíveis para a aeronave.

Para determinar a VMU, durante a certificação, são feitas decolagens onde o piloto aplica potência de decolagem e mantém o profundor totalmente cabrado desde o início da corrida. Tão logo a velocidade da aeronave permita que a asa produza a sustentação mínima necessária para voar, a aeronave sai do solo e, no instante em que a última roda perde contato com o solo, é registrada a VMU. A figura 1 ilustra um ensaio de VMU.

Normalmente, a VMU é definida quando o profundo produz força suficiente para a aeronave atingir uma atitude em que possa decolar. Uma aeronave é definida como "limitada por geometria" (geometry limited) quando a cauda bate no chão antes de ser atingida a atitude que permita a decolagem. Nesse caso, a aeronave vai arrastar a cauda na pista até que esta acelere para uma velocidade maior, onde a atitude limitada pela geometria gere sustentação suficiente para decolar.


Figura 1 - Ensaio de VMU

A VMU é utilizada na determinação da VR.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

VMCA

A próxima definição de velocidade é a VMCA - Minimum Control Speed on Air

O conceito de VMCA é similiar ao de VMCG. A diferença básica é que a VMCA é determinada para a aeronave em voo. De acordo com o FAR 25.149(b), VMCA é a velocidade na qual, ocorrendo falha súbita do motor crítico, é possível manter o controle da aeronave em voo reto, com inclinação máxima de cinco graus para o lado do motor operante. A figura 1 ilustra a condição de demonstração de VMCA.


Figura 1 - Condições de determinação da VMCA

Quando um motor torna-se inoperante em voo, o piloto deve compensar o torque produzido pela diferença de tração dos motores através de controles aerodinâmicos - essencialmente, o leme de direção. Como visto no tópico de VMCG, a força produzida pelo leme é função da deflexão e da velocidade da aeronave. Caso a velocidade diminua, a força também diminui. Há uma certa velocidade que, mesmo com a deflexão máxima do leme, a força produzida é a mínima necessária para compensar a diferença de tração. Caso a velocidade diminua ainda mais, a força produzida pelo leme não será suficiente e, então, a aeronave não será capaz de manter-se voando reto. Essa velocidade é a VMCA.

As condições exigidas pelo FAR 25 para determinação da VMCA são:
  • potência máxima de decolagem em ambos motores antes da falha;
  • CG na posição mais desfavorável;
  • aeronave compensada para decolagem;
  • peso máximo de decolagem;
  • aeronave na configuração mais crítica de decolagem, exceto pela posição do trem de pouso, que pode estar recolhido;
  • aeronave fora do efeito solo;
  • Para aeronaves com propulsão a hélice:
  1. a hélice do motor crítico deve estar em molinete, ou
  2. na posição mais provável de acordo com o projeto de controle de hélice, ou
  3. embandeirada caso a aeronave possua um sistema de embandeiramento automático.
  • a força aplicada ao leme de direção não pode exceder 150 libras. Esse requisito pode determinar a necessidade de dotar o sistema de controles de voo com atuadores hidráulicos para minimizar a força exercida pelo piloto e
  • não se pode reduzir a potência do motor operante.
A VMCA é usada na determinação da VR e da V2, que serão vistas mais a frente.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Pendências

Olá,

Essa é uma lista de pendências de definições de velocidades que eu estou eliminando pouco a pouco.

V2 - Velocidade de segurança
Vfr - Velocidade de retração de flapes
Vfto - Velocidade final de decolagem

Quando todos esses conceitos estiverem definidos, poderei passar para outros mais divertidos :-)

Até breve.

sábado, 7 de março de 2009

VMCG

A próxima definição de velocidade que será apresentada é a VMCG - Minimum Control Speed on Ground.

A VMCG é definida como a menor velocidade durante a corrida de decolagem onde, após a falha do motor crítico, o piloto consegue manter o controle da aeronave e continuar a decolagem.

O FAR 25 define na seção 25.149(e) os requisitos para o ensaio de demonstração da VMCG:
  • A VMCG deve ser ensaiada em cada configuração de decolagem aprovada para a aeronave;
  • Deve ser utilizada tração máxima de decolagem nos motores;
  • O CG deve estar na posição mais desfavorável;
  • A aeronave deve estar compensada para a decolagem;
  • Deve ocorrer falha do motor crítico;
  • A aeronave deve permancer controlável;
  • É permitida apenas a utilização de controles aerodinâmicos, ou seja, não é permitido o uso do steering da roda do nariz para auxiliar no controle direcional;
  • A aeronave deve ser capz de continuar a decolagem de forma segura, considerando habilidades normais de pilotagem;
  • A força máxima aplicada ao pedal do leme de direção não pode exceder 150lb;
  • A aeronave pode desviar-se, no máximo, 30 pés do eixo da pista mas a aeronave pode continuar a decolagem paralela ao eixo, não sendo necessário retornar ao eixo.
A figura 1 mostra um ensaio de VMCG.


Figura 1 - demonstração de VMCG

A figura 2 mostra as forças envolvidas na assimetria de tração que ocorre quando o motor torna-se inoperante.


Figura 2 - Torque gerado por um motor inoperante

Nota-se que o torque T1 depende da tração do motor remanescente e da distância entre esse motor e o eixo longitudinal da aeronave. Uma vez que, para o ensaio de VMCG, deve ser sempre usada tração máxima nos motores e que a distância do eixo do motor ao eixo longitudinal da aeronave são constantes, o torque T1 é fixo.

Para que seja possível manter a aeronave alinhada com o eixo da pista (ao menos paralelo a ele), para continuar a decolagem, o piloto precisa comandar o leme de direção para gerar um torque contrário a T1, na mesma intensidade. A figura 3 mostra um torque T2 equilibrando o efeito de T1.


Figura 3 - Compensação de torques para manter o eixo de decolagem

O torque T2 é determinado pela distância entre o leme de direção e o CG da aeronave (d2) e a força gerada pela ação do piloto (F2). Uma vez que a distância d2 é fixa, é necessário que a força F2 seja suficiente para igualar T2 a T1.

A força F2, por sua vez, é determinada pela deflexão aplicada ao leme de direção e pela velocidade da aeronave. [aqui falta uma equação] Mesmo aplicando-se deflexão máxima ao leme, existe uma velocidade mínima que gera F2 suficientemente grande para que T2 seja igual a T1.

Caso a velocidade da aeronave seja inferior a essa velocidade mínima, a deflexão máxima do leme de direção vai produzir um torque T2 inferior a T1 e, mesmo com o piloto comandando totalmente a aeronave para retornar ao eixo da pista, esta vai continuar tendendo a sair da pista, tornando-se incontrolável e obrigando o piloto a interromper a decolagem. Essa velocidade mínima é a VMCG.

terça-feira, 3 de março de 2009

Motor Crítico

Para as próximas definições de velocidades estudadas em performance de decolagem, é necessário definir o conceito de motor crítico.

Quando um motor falha em uma aeronave com mais de um motor, a diferença de tração entre o motor que falhou e o(s) que continua(m) operando, produz um momento em relação ao eixo longitudinal da aeronave que deve ser compensado através do leme de direção pelo piloto para que a aeronave coontinue voando.

A figura 1 ilustra as forças presentes em um vôo monomotor.


Figura 1 - Forças existentes no voo com um motor inoperante

Motor crítico é o motor ou um dos motores cuja falha resulta nos efeitos mais adversos na manobrabilidade e performance da aeronave.

Propulsão a Hélice

Em aviões com propulsão a hélice, o movimento das pás associado ao deslocamento do avião para frente e ao ângulo de ataque positivo, faz com que a resultante de velocidade na "pá que desce" seja maior do que na "pá que sobe". Uma vez que uma pá de hélice é um aerofólio, o aumento do ângulo de ataque da aeronave cuasa um aumento do ângulo de ataque da "pá que desce" e uma diminuição no ângulo de ataque da "pá que sobe" e, mais velocidade da aeronave, significa maior sustentação gerada pelas pás. Dessa forma, a tração gereda é assimétrica, ou seja, a "pá que desce" gera mais tração do a "pá que sobe". Por isso, uma hélice gera um torque para a esquerda na aeronave. A figura 2 ilustra a geração de tração pela "pá que desce" de uma hélice.


Figura 2 - Tração gerada por uma hélice

Em aeronaves bi-motoras a hélice, com motores que giram em sentido horário (vistos por trás), a distância da "pá que desce" do motor esquerdo em relação ao eixo longitudinal é menor do que do motor direito. Assim, há uma tendência de torque para a esquerda que se agrava quando o motor esquerdo torna-se inoperante. Como o efeito de torque para a esquerda é maior com a parada do motor esquerdo, a força necessária (e portanto a deflexão e o arrasto) a ser produzida pelo leme de direção é maior. Nesse caso, diz-se que o motor esquerdo é o motor crítico, como ilustrado na figura 3.


Figura 3 - motor crítico em bi-motores a hélice

Propulsão a Jato

Em aeronaves a jato bi-motoras, considera-se que não há motor crítico pois, como a distância entre o eixo longitudinal e o eixo de tração dos motores é igual e como também não ocorre com os motores a jato o torque existente nos motores a hélice, as forças existentes são iguais em caso de parada de qualquer um dos motores.

Em aeronaves tri-motoras, os motores críticos são os externos (instalados nas laterais da fuselagem ou nas asas - motores 1 e 3). O motor central, por ficar sobre o eixo longitudinal da aeronave, não resulta em torque quando deixa de funcionar, causando um impacto menor na performance do que os externos.

Em aeronaves quadri-motoras, os motores críticos são os dois externos pois geram um torque maior do que os internos quando deixam de funcionar. Nesse caso ainda, a pior situação acontece quando há a parada de dois motores do mesmo lado mas, para cálculos de performance de decolagem, só é computada a perda de um motor.

sábado, 28 de fevereiro de 2009

Velocidade de Estol

Para poder continuar explicando os requisitos de decolagem, é necessário apresentar a definição de uma série de velocidades que são utilizadas nessa fase do voo ou, caso não apareçam diretamente, são usadas como limite de cálculo de outras pelo fabricante da aeronave.

Algumas velocidades são calculadas e outras são obtidas através de vôos de ensaio durante o processo de certificação de uma aeronave.

Fator de Carga

Fator de carga (n) é a razão entre a sustentação produzida pela asa de uma aeronave (L) e seu peso (W). Para que uma aeronave esteja em voo reto horizontal, é necessário que a sustentação seja igual ao peso. Nesse caso, o fator de carga será 1.


Figura 1 - Equação do fator de carga


Ângulo de Ataque e Coeficiente de Sustentação

Observando-se a equação da sustentação (Figura 2), nota-se que esta é diretamente proporcional ao quadrado da velocidade e ao coeficiente de sustentação (CL). Sendo assim, mantendo-se voo reto horizontal, quando diminui-se a velocidade é necessário aumentar o CL para manter a sustentação constante e, consequentemente, o fator de carga igual a 1 (lembrando-se que o peso é constante para um dado instante do voo).


Figura 2 - Equação da Sustentação

A maneira de aumentar-se o CL é aumentando-se o ângulo de ataque. Esse aumento produz um aumento do CL até um ponto máximo, a partir do qual o fluxo de ar descola-se da asa e o CL diminui. Esse ponto é conhecido como ponto de CLMAX e coincide com o ângulo de ataque onde ocorre o estol. A figura 3 mostra a relação CL x ângulo de ataque.


Figura 3 - CL em função do ângulo de ataque

O ângulo de ataque onde o CL é máximo é conhecido como ângulo crítico (também chamado de ângulo de estol, ângulo de sustentação máxima ou ângulo de perda).

Dispositivos Hipersustentadores

Uma outra forma de aumentar o CL sem mudar o ângulo de ataque é utilizar-se dispositivos hipersustentadores como flaps e slats, mostrados na figura 4. O uso de tais dispositvos é considerado nos cálculos de decolagem e pouso por aumentar significativamente o CL, conforme mostrado na figura 5.


Figura 4 - Tipos de Flapes




Figura 5 - Variação do CL em função da posição de flap

Ocorre que, como a configuração de flaps / slats numa decolagem é constante, o fabricante deve determinar uma velocidade de estol para cada configuração de decolagem aprovada para a aeronave.

Velocidade de Estol


A velocidade de estol é defina como a mínima velocidade em que a asa pode pruduzir sustentação suficiente para suportar a aeronave.

Requisito

FAR 25.103 - Stall Speed - The reference stall speed, VSR, is a calibrated airpeed defined by the applicant. VSR may not be less than 1-g stall speed.

Até meados da década de 80, o FAR 25 estipulava uma definição para ensaios de determinação de velocidade de estol que era:

  • Após a ocorrência do estol, o piloto deveria continuar puxando o manche para entrar em um estol mais profundo;
  • A menor velocidade registrada durante a manobra era declarada a velocidade de estol para a configuração em teste;
  • Os cálculos ignoravam o fator de carga quando calculando o CL e a velocidade.
Durante o processo de certificação da aeronave Boeing 767-300, surgiram algumas questões relacionadas à determinação da velocidades de estol que provocaram a mudança do FAR 25 para o conceito hoje conhecido como 1-g Stall Speed:

  • Quando ocorre o estol, a recuperação é iniciada imediatamente, ao contrário do que ocorria no passado;
  • A velocidade onde ocorre a maior sustentação é definida como velocidade de estol;
  • Os cálculos passaram a levar em consideração o fator de carga.
Com essa modificação, a 1-g stall speed (método novo) é cerca de 5 a 7% maior do que a FAR stall speed (método antigo).

Determinação da Velocidade de Estol

No ensaio para determinação da velocidade de estol, os seguintes pontos devem ser seguidos:

  • Potência em idle;
  • Asas niveladas, desaceleração com 1-g (Lift = Weight);
  • Aeronave compensada para vôo nivelado em velocidade entre 1.13 e 1.3 VSR;
  • Passo de hélice ajustado para decolagem (se aplicável);
  • Trem de pouso e flap ajustados para a configuração que se deseja calcular a velocidade de estol (configuração de decolagem por exemplo);
  • CG na posição mais desfavorável;
  • A desaceleração deve ocorrer a uma razão de um nó por segundo;
  • A aeronave é considerada estolada quando dá ao piloto uma indicação clara de natureza aceitável que está estolada - FAR 25.201(d). Essa indicação pode ser:
- Uma atitude de pitch down que não pode ser imediatamente recuperada;
- Buffeting significativo; ou
- O controle de pitch atinja o batente traseiro e não ocorra aumento de pitch com o controle mantido nessa posição.

Caso a aeronave possua um sistema que empurre o nariz para baixo em um determinado ângulo de ataque (stick pusher, por exemplo), a velocidade de estol deve ser, no mínimo, 2 kts ou 2% (o que for maior) acima da velocidade de atuação do dispositivo.

Efeito do Peso

Quando o peso de uma aeronave aumenta, as características aeroelásticas da asa permitem uma maior flexão, o que causa uma diminuição do CL para uma dada configuração em relação a um peso menor, como mostrado na figura 6. Como o CL diminui, é necessário aumentar o ângulo de ataque para manter a sustentação. Em uma situação extrema (ângulo de ataque crítico), a sustentação será menor na aeronave pesada e, para manter a sustentação igual ao peso é necessário aumentar a velocidade.

Por isso, a velocidade de estol aumenta quando o peso aumenta.


Figura 6 - Efeito do peso no CL

Efeito da Posição do CG

Para manter uma aeronave em vôo horizontal, é necessária uma força para baixo produzida pelo estabilizador horizontal, como mostrado na figura 7 e a sustentação produzida pela asa deve ser:

LWING = W + LTAIL


Figura 7 - Força necessária no estabilizador para voo reto horizontal

Se considerar-se um deslocamento do CG para trás, será necessária uma força menor produzida pelo estabilizador horizontal. Com peso constante, a sustentação da asa pode ser menor para manter o voo o que requer um ângulo de ataque menor.

Com a necessidade de um ângulo de ataque menor, é possível produzir a sustentação necessária para voar em uma velocidade menor quando o CG está mais para trás.

Uma vez que o CG trazeiro permite velocidades de estol menores e o FAR 25 requer que o CG esteja na posição mais desfavorável para a realização dos ensaios, os voos de teste devem ser feitos com o CG no limite dianteiro.

Velocidade de Estol em Curva

Quando a aeronave inicia uma curva nivelada, a sustentação deve aumentar para compensar a perda resultante da inclinação do vetor de sustentação, mostrada na figura 8.


Figura 8 - Composição de forças em curvas

Para aumentar a sustentação mantendo-se a velocidade constante é necessário aumentar o CL, aumentando-se o ângulo de ataque. Numa situação de ângulo crítico, a sustentação total não será suficiente para manter o vôo nivelado, sendo necessário aumentar a velocidade. Dessa forma, a velocidade de estol em curvas é maior do que em vôo horizontal.



FAR 25 - Requisitos de Certificação de Aeronaves

No Brasil, a legislação aeronáutica é definida, além de outras publicações, pelos RBHA - Regulamento Brasileiro de Homologação Aeronáutica. Existem diversos RBHAs, cada um tratando de um assunto específico.

No caso de certificação de aeronaves comerciais, o RBHA pertinente é o RBHA 25 - Requisitos de Aeronavegabilidade. Aviões Categoria Transporte. No entanto, o texto do RBHA 25 apenas menciona que o Brasil adota integralmente o FAR 25, emitido pela FAA e diz que o texto do regulamento pode ser obtido em:
http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?&c=ecfr&tpl=/ecfrbrowse/Title14/14tab_02.tpl

O FAR 25 chama de applicant um fabricante de aeronaves que vai submeter um processo de certificação de um tipo de aeronave à FAA. Uma vez que o FAR 25 é uma publicação sujeita a revisões e que o processo de certificação de um tipo de aeronave é longo, pode ocorrer de um requisito ser modificado durante o processo, o que exigiria refazer cálculos e ensaios em voo necessários para a determinação do requisito modificado.

Para evitar esse problema, existe uma versão de "referência" do FAR 25 para cada tipo de aeronave. O fabricante deve utilizar para certificar uma aeronave a versão do FAR 25 que estava em vigor na data em que deu entrada formalmente na FAA com o processo de certificação. Modificações que por ventura surgirem depois dessa data não são consideradas.

As definições apresentadas nesse post serão usadas nos seguintes, que tratarão de alguns requisitos de velocidades aplicáveis nas decolagens.

Nota: Existe um projeto da ANAC de mudar o nome de RBHA para RBAC - Regulamento Brasileiro de Aviação Civil mas isso ainda não está implantado.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Comprimento de Pista - Parte 2

Olá,

Eu gostaria de acrescentar algumas informações ao post sobre Comprimento de Pista.

De um ponto de vista teórico (e às vezes cobrado em provas de performance), o comprimento de pista pode ser corrigido para fatores externos como vento, slope, obstáculos, etc. Essas correções não precisam ser aplicadas manualmente quando da realização dos cálculos de peso máximo de decolagem pois, tanto os gráficos dos AFM como os softwares de performance, fazem as correções automaticamente.

A nomenclatura utilizada para as correções é:

  • Comprimento físico ou real - é o comprimento de pista medido de uma cabeceira a outra, ou seja, corresponde ao conceito de TORA apresentado anteriormente.
  • Comprimento efetivo - é o comprimento físico corrigido para a existência de obstáculos na trajetória de decolagem. Quanto mais alto e/ou mais próximos da pista estiverem os obstáculos, menor o comprimento efetivo. Caso não existam obstáculos, o comprimento efetivo é igual ao físico.
  • Comprimento retificado - é o comprimento efetivo corrigido para efeitos de vento e slope. Para decolagem, vento de proa e slope negativo (descida) fazem o comprimento retificado ser maior do que o efetivo. Já vento de calda e slope positivo (subida) fazem o comprimento retificado ser menor que o efetivo.
Esses conceitos não são muito usados no dia-a-dia na Engenharia de Operações mas aparecem costumeiramente nas provas de PC e PLA da ANAC.

Até breve!

sábado, 14 de fevereiro de 2009

Comprimento de Pista para Decolagem

Esse blog foi criado com o intuito de manter separados os artigos relacionados à performance de aeronaves dos demais que eu coloco no blog Javaplane.

Todos os conceitos aqui apresentados baseiam-se nos regulamentos aplicáveis à certificação e operação de aeronaves de transporte de passageiros - FAR 25, RBHA 121, etc.

O primeiro post trata do comprimento de pista disponível para decolagem e servirá de base para os próximos, que tratarão dos requisitos de distância e peso máximo de decolagem.

Quando tratamos do comprimento de pista disponível para decolagem, as seguintes definições se aplicam:

TORA - Takeoff Run Available - É o comprimento de pista declarado pelas autoridades disponível e apropriado para a corrida da aeronave no solo.


Figura 1 - TORA

STOPWAY
- SWY
- Área após o final da TORA, com largura igual ou superior a da pista, centrada com seu eixo e designada para desaceleração e parada no caso de uma decolagem interrompida.

É importante destacar que a stopway só pode ser usada para interrupção de decolagem, não podendo ser computada em nenhum outro cálculo de decolagem ou de pouso.

A soma da TORA com a SWY é conhecida como ASDA - ACCELERATE-STOP DISTANCE AVAILABLE, ou seja, a distância total disponível para a aeronave acelerar, interromper a decolagem e parar.

ASDA = TORA + SWY



Figura 2 - Accelerate Stop Distance Available

CLEARWAY - CWY - Área após o final da TORA, com largura mínima de 500 pés, centrada com o eixo da pista, livre de obstáculos e com extensão máxima igual a 50% da TORA, podendo tem um slope máximo de 1,25% em relação a pista. É utilizada para melhorar a performance da aeronave, aumentando a distância disponível para a aeronave atingir a screen height durante a decolagem.

A soma da TORA com a CWY é conhecida como TODA - TAKEOFF DISTANCE AVAILABLE, ou seja, a distância total disponível para a aeronave acelerar e atingir a screen height durante a decolagem.

TODA = TORA + CWY


Figura 3 - Takeoff Distance Available

Nada impede que uma mesma pista possua stopway e clearway simultâneamente. Caso isso ocorra, tanto os cálculos de accelerate-stop quanto os cálculos de accelerate-go poderão ser melhorados.

SCREEN HEIGHT - Altura mínima que a aeronave deve atingir sobre a cabeceira oposta da pista ou sobre o final da clearway, caso essa exista, durante a decolagem. Possui 35 pés para cálculos de decolagem em pistas secas e 15 pés para pistas molhadas e contaminadas.

No próximo post escreverei sobre os requisitos de pista para decolagem conforme os regulamentos em vigor.

Até breve.